domingo, 6 de novembro de 2011

como uma lua na água



«Toco tua boca,
com um dedo toco o contorno da tua boca,
vou desenhando essa boca como se estivesse saindo da minha mão,
como se pela primeira vez a tua boca se entreabrisse

e basta-me fechar os olhos para desfazer tudo e recomeçar.
Faço nascer, de cada vez, a boca que desejo, a boca que a minha mão escolheu
e te desenha no rosto,
a boca eleita entre todas, com soberana liberdade
eleita por mim para desenhá-la com minha mão em teu rosto e que por um acaso,

que não procuro compreender, coincide exatamente com a tua boca,
que sorri debaixo daquela que a minha mão desenha.
Tu me olhas,

de perto tu me olhas, cada vez mais perto e, então, brincamos de cíclope,
olhamo-nos cada vez mais de perto e nossos olhos se tornam maiores,
aproximam-se, sobrepõe-se e os cíclopes se olham, respirando indistintas,
as bocas encontram-se e lutam debilmente, mordendo-se com os lábios,
apoiando ligeiramente a língua nos dentes, brincando nas suas cavernas,
onde um ar pesado vai e vem com um perfume antigo e um grande silêncio.
Então, as minhas mãos procuram afogar-se nos teus cabelos, acariciar
lentamente a profundidade do teu cabelo enquanto nos beijamos
como se tivéssemos a boca cheia de flores ou de peixes,

de movimentos vivos, de fragrância obscura.
E, se nos mordemos, a dor é doce;
e, se nos afogamos num breve e terrível absorver simultâneo de fôlego,
essa instantânea morte é bela.
E já existe uma só saliva e um só sabor de fruta madura,
e eu te sinto tremular contra mim, como uma lua na água.
Sempre a te amar ...
beijos ... saudades ...»

*

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